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METRÔ


Já entrou no metrô empurrando. Não deu a menor chance para quem queria sair. Quem não encarou saltou na próxima.


De jeans rasgado no joelho. Mochila abarrotada. Cabelo preso no alto da cabeça. Cara de mau humorada demonstrando nenhuma paciência com a vida.

Sentou-se esparramada.

Parecia cansada.

Encarava a todos causando aquele constrangimento típico do criador de problema para desopilar.

Os olhares baixaram.

Era tarde. Retornando do trabalho, em sua maioria, os usuários do modal não estavam predispostos a se acabrunharem na volta para casa. Queriam chegar. Roteiro com desfecho certo. Nada de surpresas.

Improvável era ela. A provocação travestida de ser humano fêmea não sossegava.

O carro ficou tenso. Todos torcendo por uma chegada mais do que imediata em suas estações destinos.

Percebendo a fuga em massa de sua personagem, ensaiou um bocejo com trejeitos de arroto que não tinha como ignorar.

Agora ela estava satisfeita. Tinha conseguido a atenção perseguida. Indubitavelmente.

A tensão gerada se desfez no ato.

Houve quem se enojasse. Houve quem quisesse rir, mas não se atreveu.

Cheguei a pensar que tal regurgitação seria um prenúncio de algum discurso já ensaiado.

Engano.

Aquele ato era pura inspiração para indagações existenciais dos que não sabem se querem ou não existir.

Toda aquela digressão remetia na verdade ao nada. Tive um lampejo de vislumbre de ser efetivamente esta a intenção.

Afinal não queria nada. Nem tinha que querer.

Ignorância minha.

Imagem: Unsplash: Brandon Mowinkel


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